quinta-feira, 21 de junho de 2012

A TENTAÇÃO NATURAL

A tentação que todos temos de escrever, de nos juntarmos ao mundo que se vê e que se sente, ao mundo que nos provoca emoções.
Não há Evas ou Adões neste mundo. Todos somos os primeiros, porque nascemos no interior dos outros, dos que escreveram antes.
Todos nós copiamos textos que não sabemos que existem.
Todos nós somos todos os autores antes de nós.  Se quisermos ser Shakespeare, podemos dizer palavras, palavras, palavras.
Mas podíamos ser Pessoa ou Camões, porque recebemos palavras ao mesmo tempo que nos impossibilitamos de as dizer até ao fim, de exprimir o nosso sentimento.
Todos queremos deixar obra para a posteridade, nem todos o conseguem, mas muitos tentam.
Todos queremos ser recordados nem que seja com um simples diário e é sempre uma tentação de quem habitou a Terra.
As pessoas são muito diversas, mas apenas no acessório, no essencial somos todos muito parecidos.
Quando somos crianças mimadas, pensamos ser o centro do Universo. Somos omnipotentes.
Crescemos e continuamos a sonhar um pouco com isso, mas a sociedade é o contrário, é admitir que cada um é importante por si mesmo e que nós somos apenas mais um dentro de um mundo de pessoas que têm os seus próprios fins... ora isso é difícil de suportar.
Quando nos pomos a falar connosco próprios, a filosofar, é prepararmo-nos para morrer, segundo Sócrates, é nessas alturas talvez que nos colocamos perante os tais dilemas insolúveis, entre os quais a morte.
Quem pensa pela sua própria cabeça, quem filosofa, reflecte filosoficamente sobre tudo.
Podemos fazer filosofia a partir de qualquer coisa, eu faço a partir da minha vida.
A minha vida não é enfática, logo as frases que escrevo não são pensadas para serem máximas.
Vivemos numa sociedade paradoxal. Quanto mais global se torna, mais pessoas há a defenderem a sua individualidade.
Mas falava eu do tema da separação, da impossibilidade de vivermos para sempre e é isso que nos leva à tentação natural de nos prolongarmos nos outros e escrevermos para nos repetirmos.

4 comentários:

Helena disse...

Escrevemos para acertar contas connosco.
(A contas com o mal que nos fazemos, a contas com o bem que nos queremos.)

Beijo pouco matinal, Homónima

lenço de papel; cabide de simplicidades disse...

beijo Homónima

lua vagabunda disse...

Acredito que NÃO HÁ COINCIDÊNCIAS MAS SIM CONVERGÊNCIAS... e estou a ler este teu texto ao mesmo tempo que ouvia Saramago...

Que espectáculo!!!!!!!!! Ora vê/ouve:

http://youtu.be/YJTfArX2KDs

lenço de papel; cabide de simplicidades disse...

muito obrigada Manela