terça-feira, 8 de dezembro de 2015

COMECEMOS ENTÃO PELO PRINCÍPIO

Nasci em casa, era moda naquela altura, imagine-se! No rádio passava o folhetim Tide.
E nessa altura tenho memória (risos) que não seria grande dádiva para a Humanidade.
Pertenci desde logo à Invicta Cidade e ela de seguida pertenceu-me completamente.
Com o tempo lá fui perdendo o saber que julgava possuir.
Alturas há em que a realidade me anda a parecer ficção, sendo que a ficção começa a pagar-se na mesma moeda.
Sou uma reprodução dos meus pais e de muitas outras coisas. Coisas antigas, coisas a que já ninguém liga.
À pergunta se fosse hoje  tinhas mudado muito coisa na tua vida? Tinha, mesmo muita.
Reconfiguremos os factos em função das circunstâncias (risos).
Se nascesse hoje não vinha com estas doenças hereditárias, pediria logo o cardápio  das doenças.
Nasci virada para o Rio Douro, aí não mexia.
Não vou narrar ordenadamente estes acontecimentos.
A entrada na escola primária é algo de que me não esqueço por se ter dado o infeliz acontecimento da morte do meu avô materno. Tingiram de preto o meu casaco  vermelho, de godés, cortado na cintura, o tal que me fazia uma princesa.
Foi uma maldade materna muito grande.
Depois fui para a adolescência aos pulos. Dancei, ouvi música, li muitos livros que a censura proibia e sonhava, sonhava muito. Todo o dinheiro que arranjava era para o meu bem amado cinema e teatro e livros.
Trabalhei cedo, estudei, tive dúvidas, muitas e cursei dois cursos.
Um dia dei comigo quase adulta, sem quase nada entender da vida e casei.
Sou portuguesa dos quatro costados, burguesa do Porto, oriunda da fidalguia rural pelo lado paterno, o mais vincado em mim e da pequeno burguesia urbana por parte materna.
Podia aqui fazer variadíssimas elucubrações filosóficas e teóricas sobre o que foi a época em que vivi os anos da minha infância e juventude, mas se bem que fossem os negros anos do fascismo e o meu pai perseguido pela PIDE, vivi alegre e feliz numa família alargada e sempre tive o amor e brinquedos que me acalentavam.
O meu pai, artista e publicitário, ensinava-me a ler os jornais e fazer resumos de tudo o que lia, o meu avô, empresário, contas, porque dizia que as contas eram muito importantes, a minha mãe levava-me às compras, era uma especialista nesta matéria, começávamos sempre pelo Mercado do Bolhão com a Srª Glória a dar as suas doutas opiniões, perfeitamente cúmplice comigo, a minha avó o amor à família, as rendas, as malhas, etc.
Era bom ter nascido e havia muita magia.
Em adulta descobri países e gentes.
Agora envelheci, envelheci mal com as perdas que se tornaram uma espécie de pastiche na minha pele sensível.
Sou pessimista por natureza e crême de la crême para esta forma de estar na vida, vem a crise política, social, de valores e princípios no nosso país e no mundo que a todos afecta.

2 comentários:

GL disse...

Curvo-me perante esta partilha, por este escancarar de portas, não apenas da memória mas, e principalmente, do coração.
Vida cheia, preenchida, atrevo-me a dizer: vivida em pleno.

Abraço.

lenço de papel; cabide de simplicidades disse...

obrigada minha amiga