domingo, 7 de maio de 2023

HOMENAGEM ÀS MINHAS MÃES

NUNCA PENSEI CHEGAR AQUI MINHA MÃE A tua ausência incarna em mim todos os dias. Sim, minha mãe nunca fui neutra, achei que as ovelhas deviam ser defendidas do lobo. Eu sei mãe que não sou pastora. Mãe tive duas, é para essas duas que falo. A minha mãe e a minha avó. A minha avó, republicana, nascida no ano da implantação da República, dizia-me sempre que a democracia era politicamente partidária e por isso defendia a sua Leninha de tomar sempre partido. Ela dizia que eu não confundia os géneros, apenas confundia a mão direita com a esquerda quando era muito, muito pequena, mas ensinou-me a não confundir. As duas liam e gostavam de Camilo Castelo Branco e transmitiram-me essa verdadeira paixão. Sim, minha mãe, não caminharei nunca pelo indiferentismo, não faz parte dos meus genes. Lembro-me quando disseram que tinham feito uma promessa à Santa Clara ou à Nª Senhora de Fátima para eu falar. Ainda hoje acho que foi a Nª Srª de Fátima, de quem muito gosto, que me diz, baixinho, que tenho de reaprender a falar, quando falo mais do que devo, mas por outro lado tem medo que o monólogo me ensurdeça. Ouço a minha mãe, que era mais crítica, dizer ainda recentemente antes de morrer: olha que não devemos ser oposição, estamos em democracia. Já a minha avó gostava mais dos slogans se não fossem sem conteúdo. Na realidade minha mãe eras mais forte do que eu, para ti era inútil proporem-te miríades sem conteúdo imediato. Avó minha e, tu que conhecias todas as máscaras dos interesses concretíssimos, eras uma burguesa ainda por cima brasonada, secretamente muitas vezes vinhas a terreiro, aterrorizada pelas injustiças que não conseguias remediar. Nenhuma de vós se achou o centro do mundo e isso foi muito bom para me ensinarem a não me intoxicar. Nunca se falava de Salazar lá em casa comigo, claro, porque meu pai tinha sido preso por ser contra a política dele, mas ouvia-Vos. Minha mãe dizia, lembras-te mãezinha, que ele era desprovido de imaginação, era apenas uma boa dona de casa dizia a minha mãe para a minha avó, que detestava gente sem imaginação, ela fazia capas para livros, bordava quadros e uma série de coisas mais. Portanto,sempre achei que a política dele (Salazar) era muito caseira desde os 6 anos. O meu avô, espanhol, argumentava que ter-se orgulho por ser contra o Estado Novo, não era grande coisa, porque o EN era simplesmente lamentável e continuava a ouvir ópera até adormecer de pé, nos serões lá de casa. Minha mãe está a chegar o S.João e tu gostavas muito de ver os 'arrolados' como lhe chamavas, os que nem encontravam a casa, por isso íamos às Fontainhas no dia seguinte. Fica a saber minha mãe que a partir de amanhã vou tratar dos fetos que estão a invadir oa Agapantos. Quero os Agapantos lindos e limpinhos no S.João. A erva-cidreira está por todo o lado. Ontem bebi um chá com as folhas que fui cortar. Não te quero preocupar, mas o meu estômago anda um pouco abalado, até me parece que quer copiar a delicada democracia. Fica bem, querida mãe que também vou fazer por isso. Avó, tu estás bem, nunca te ouvi dizer o contrário, quem me dera ter aprendido mais contigo, mas fui fraca aluna.

1 comentário:

Anónimo disse...

Muito bom.bjinho