quarta-feira, 16 de maio de 2012

OS PIGMEUS

Somos um povo de pigmeus, mas somos responsáveis por isso e de mim me queixo.
Somos um labirinto de contradições no dia-a-dia, no entanto reduzimo-nos a um cabide de simplicidades.
Claro que depois vêm os protestos da realidade.
Às vezes pinto deuses como os gregos faziam, para ver se vejo gente.
Somos uns hipócritas, à espera de ver a carroça passar.
Vemos todo o tipo de imunidades passar, mas mesmo assim não raro, aplaudimos.
Os inocentes e os mentirosos andam de braço dado.
Muitos de nós entramos em comboios errados e no entanto deixámo-nos estar sentados, mesmo quando nos sabemos no sentido contrário ao destino, mesmo assim deixamo-nos estar.
No meu caso, continuo igual ao que sempre fui em matéria de ideais. Gostava que abandonássemos a parolice fingindo que somos civilizados, de nos ver agarrados ao nada com unhas e dentes.
As pessoas, muitas, demasiadas, admiram quem tem a coragem de actuar sem escrúpulos, como se fossem empresários de talento.
Não admiro essa gente e como eu muitos há, mas gente como nós perde-se na espuma das vagas encapeladas dos valores e dos princípios.
No meu caso, faço de tudo para manter a minha energia de raiva inteira e, não desisto das palavras, embora já não invista em acções só para provocar, já concentro a energia e começo a saber utilizá-la criteriosamente.
Não, não vou fazer escavações arqueológicas profundas na memória de mim nem na do povo a que pertenço nem na liturgia de salamaleques a que assistimos todos os dias, de qualquer modo vou deixando aqui algumas peças do puzzle dos meus sentires passados, presentes e futuros, dos meus diversos eus.
Temos todos medo do tempo, de o termos de atravessar nos seus retrocessos quotidianos, mas há dias em que trabalho com as emoções e não me emociono.
O meu diário não pode ser mais objectivo que uma  vida pessoal.
Quando não publicava aqui no blogue, não colocava títulos nos "textos" diários e portanto tudo era mais fluído e fácil, mas também é verdade que desta maneira aprendo mais a colocar os muros, porque o mundo é feito de muros que nos esperam.
Ainda não consigo soltar as minhas recordações, presentes, passadas e futuras, por isso me afasto delas muitas vezes para parte incerta. Quando se é escritor deve ser mais fácil, há sempre uma forma de dizer que por detrás entre as nuvens, fica o Castelo dos  Mouros, agora assim é bem mais difícil quando não há o génio a soltar-nos as palavras e por vezes ficam de novo lacradas.
Só consigo expôr-me por fragmentos.
Sou grande admiradora de diários, li os de Miguel Torga em dezasseis livros, os do João Chagas, não me recordo se li quatro dele, li Maria Gabriela Llansol e uma espécie de seu diário e alguns outros. Admiro pessoas que fazem a limpeza dos anos com o pano do diário, como a saldar a dívida com a vida.
Comecei por falar dos pigmeus que somos e acabei, como sempre, parece-me a fazer cortesias a Bach como dizia um querido amigo.
Dizia para não me debruçar tanto do parapeito da janela com a tentação de ver Bach.
Continuo a lutar entre o interior e o exterior, com a consciência do vidro.

2 comentários:

Helena disse...

Pois eu gosto das tuas cortesias a Bach!
(que bela expressão!)

lua vagabunda disse...

eu tb... não perco uma!