sexta-feira, 20 de abril de 2012

COMPREENDER O MUNDO

Explicá-lo, desprezá-lo, nunca foi o meu forte.
Apenas o observo e a mim com admiração.
Sinto-me, actualmente, num palco de todas as formas, tudo o que é presente, passado e futuro.
Há relativamente pouco tempo fiquei a saber que havia uma palavra que não existia, a palavra sempre, já tinha aprendido a palavra nunca. Agora são duas que não existem: sempre e nunca.
Também sei que odiar é uma palavra teatral.
Aprendi que não posso viajar para fora de mim. Não quero afundar-me na realidade. Não quero encarar esta realidade, preciso de sonhar. A doença tem-me afastado do mundo.
Há zonas de sombra do conhecimento humano e tenho-me dedicado a essa zonas, mas verifico em mim um certo cansaço. As minhas simpatias por variadíssimos temas e pessoas começam a ser derrubadas. Estou cansada de compreender a dor, de simpatizar, de me revoltar em palavras ou pensamentos contra a injustiça, algumas vezes estive sozinha nessa luta.
Fui educada na repressão, a quem proibiam meter os dedos no nariz, escrever nas paredes, mostrar a língua ou fazer manguitos e agora está na hora de despejar obuses contra S. Bento. Não é fácil fazermos grandes esforços de acertar as horas uns pelos outros, acoplá-las mesmo para nos encontrarmos na hora certa.
Durante 38 anos fomos libertados das mil cadeias e agora vêm-nos com a conversa, a recomendação da Pax Romana, da paz dos submissos, da paz podre.
Todos nos queixamos, mas são inúteis as nossas queixas. Estes escravos que temos hoje a governar-nos não amam a liberdade. Como podem escravos gostar e formar espíritos livres?
Vivemos numa atmosfera de pouca permanência, de salve-se quem puder, de vamos lá acabar com isto, antes que isto se nos acabe. É fartar, vilanagem.
Não me apetece tentar explicar tudo, todas as injustiças do mundo como antes fazia e começo a ficar uma especialista em estranheza. Vejo muita encenação na vida.
Não se pode chamar democratas a pessoas que apenas arregaçam as mangas, usam chinelos de meter o dedo e vão às compras ao supermercado.
Neste mercado livre, diz-se que a iniciativa e a concorrência produzem igualdade, mas sabemos que esta igualdade, é para quem pode, porque quem não pode arreia.
Sinto-me entrincheirada entre os bota-abaixo sistemáticos e cegos, com a frustração das energias criadoras e os medíocres com almas transviadas reduzidos simplesmente ao mínimo denominador comum, aos que vivem das aparências, na lei do menor esforço, na compostura como mortos-vivos, aos mascarados que adoptaram a postura das renúncia e da acomodação.
Neste momento da vida, a imaginação e a experiência devem estar empatadas.
Com esta idade, recordo uma frase que ouvia ao meu avô, espanhol mas que se sentia português,  teria os meus 16/17 anos: Sabes o que os galegos (ele era de Sevilha) em Lisboa costumavam dizer? "nós vimos cá vender-lhes a água que é deles".
O nosso país parece estar cheio de possíveis salvadores, de profetas e bandos de discípulos.
Impõem-nos uma verdade única, como se impõe uma fé num deus, e dizem-nos que quem não acreditar e venerar esse deus, se torna vulnerável. Mas parece que poucos hoje têm essa fé num país melhor amanhã, sendo que este amanhã varia muitas vezes. Umas vezes é para 2013, outras a iniciar em 2013, outras em 2014 e outras ainda porque 2015 fica depois de 2014 e portanto seria a começar em 2015. Eles sabem tanto como o gato.
O que é ainda verdade? O que é ainda acreditável? E o que sobrará depois de tudo sabermos, se algum dia viermos a saber?
Começo a ficar profundamente cansada.
Definitivamente há coisas que são irrecuperáveis, talvez isso prove a realidade do passado, do meu passado que às vezes se mistura com a do país e, sinto um vazio dentro de mim.
Eu sei que vai passar, tudo passa, mas enquanto não passa, há que reduzir a pó esta impotência e lutar, lutar, lutar contra o "diabo" que quer verdadeiramente tomar posse de tudo, até das almas.

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