terça-feira, 17 de abril de 2012

QUANDO FITAMOS OS PÉS DOS OUTROS

Podem ser as leis do acaso que nos levam aos sapatos de calfe com meias confortáveis do cavalheiro.
Pode ser a vontade que tenho de pensar noutra coisa ou talvez porque simplesmente naquela altura não esteja a fazer jogo limpo... ou ainda para não me pôr verde de cólera... ou quem sabe, para transferir o problema e desta vez do social para o particular.
Trata-se duma espécie de fazer o cenário apagar-se ou mesmo um gesto de socorro ou ainda, quem sabe, sonhando o passado.
Momentos de espera para não emaranharmos os pensamentos, para os voltar a enovelar, para rectificar o coração e sossegar o estômago.
Nem sempre o corpo e o espírito se comportam como  dois amantes experimentados e sabem extrair dos quase nada o calor imenso de tudo.
Por vezes temos medo das nossas próprias palavras e escondemo-nos delas nem que seja por segundos, receamos as suas cheias, aquilo que transportam dos acontecimentos vividos e antes que venham na enxurrada distraímo-nos olhando para qualquer lado.
Já fui(fomos) várias vezes surpreendidos com a potência destruidora de certas palavras.
Muitos autores já o disseram, mas eu leitora delas, também o repito, visitar-me a mim ou revisitar-me duma outra forma é estar de visita ao mundo.
Quem pensa dispõe-se a um infinito de realidades para além de si mesmo,(já nem sei se esta frase é minha ou não, acontece-me algumas vezes, de tão entranhadas em mim tornam-se minhas. Agora lembrei-me, esta é das Gabriela Llandsol, suponho, mas acho o mesmo, aliás penso que toda a gente pensa o mesmo e, ponho-me a pensar como posso eu ter medo?
Não tenho medo, senão não vinha para aqui todos os dias sentar-me ao computador, sem saber o que vou dizer, a não ser que tenho dificuldade em seleccionar tudo o que tenho para dizer, portanto a escrita e o medo são absolutamente incompatíveis.
Porque é que isto acontece?
Será o uso pessoal que faço do  mundo  nestas horas minhas?
Será porque a minha voz se cala em fragmentos de silêncio, silêncio que eu tanto amo?
Será porque continuo a ser uma mulher da Filosofia e tendo sempre para ela, abraço-a quando me sinto mais nua, mais desprotegida?
Ou será porque quando se trabalha com as emoções não nos emocionamos tanto?
Imaginamos o mundo e penso na forma de o decifrar para sobreviver e isso cansa-me muito, quase me esgota e então olho para um ponto que esteja ao meu alcance como me dizia a Teresa Rosmaninho e nesses momentos mantenho-me muda e olho para o cão a farejar pelo chão e a levantar a carpete, se ele estiver por perto e, mais uma vez fito os sapatos de alguém que me está próximo ou em imaginação.

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