quinta-feira, 26 de abril de 2012

A MORTE

Devíamos tratar a morte por tu, mas não é isso que acontece, nem os católicos de verdade, o fazem. Alguns tentam esquecer.
Todos somos sobreviventes, tens diante de ti, diante de vós, uma sobrevivente. Faço parte, como vós igualmente.
Estamos todos na linha de montagem, embora cada um de nós evite a sua vez muitas vezes, no meu caso coleccino os pormenores.
Não conseguimos fugir-lhe, mesmo que lhe ofereçamos todos os nossos bens, não é corruptível, considera toda a gente igual.
Os fanfarrões, os dogmáticos, os burgueses, os idiotas, os maus, os bons, todos se vão.
Claro que não pensamos na morte, isso só acontece quando nos morre alguém que conhecemos e temos que contactar com ela mais de perto, mesmo assim, quando nos poupa o sacrifício do corpo, quando só pratica antropofagia psíquica ou o assassínio da alma, é só durante um certo tempo. Às vezes dá-nos lugar à solidão, quando nos leva os nossos entes mais queridos, mas ainda aí, o corpo medita o espírito e a tristeza promete a lucidez e só fazemos um intervalo da morte quando as lágrimas secam e se instala o luto.
Nestas altura reflectimos e acreditamos que não somos tudo.
Vivemos em busca dos prazeres e muitos de nós também buscam objectivos, enquanto assim é, a vida torna-se clara e paradoxalmente repousante.
Conhecemos pessoas que se querem sempre apaixonadas, em constante princípio do prazer, exactamente para fugirem e se protegerem do desaparecimento, torna-se uma espécie de refúgio, embora a morte duma paixão os torne uma espécie de extra-terrestres, mas que preferem ignorar.
Carregamos connosco toda a carga de amargura, de ternura, de deixa-andar fechada a cadeado, insuspeitos fardos que acumulamos, brincamos a pessoas normais, às vezes a adultos, outras a intelectuais, mas não deixamos de ser aquele ou aquela rapariga que nos  conhecemos na juventude que mora por baixo das palavras. Podemos até construir personagens, coleccionar segredos e somos uns desconhecidos para nós-mesmos. Quando o deixamos de ser a morte está perto.
Há mortes que mais não são que um estoirar de amargura.
Vou acabar este tema hoje, se calhar ainda não estou preparada para o abordar, mas de tantas vezes que me visita, necessidade tenho de o "debater".
Prefiro terminar com um tema, que será um dos próximos a abordar e que é a paixão ou as paixões, já  no outro dia abordado, no que confere à idade uma certa habilidade para jogar com o prazer, com o que concordo.
Quanto à morte só lhe podemos marcar encontro, escolher a ocasião sem sermos surpreendidos por si numa única situação, se nos concentrarmos e quisermos ter o sentido do limite, de contrário é sempre ela a mostrar-nos os nossos limites e os dos outros, é irmã gémea da vida.
Logo que possa, eu, tu, ele, nós, vós, eles vamos esquecer tudo isto e continuarmos nos pormenores do quotidiano, insignificantes, mesquinhos, até horríveis, mas estes assuntos  também, se calhar, farão  parte apenas dos nossos diários íntimos, se conseguirmos lá chegar.

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